Confissões ao pé do ouvido
- Márcia Detoni
- 31 de jan. de 2022
- 2 min de leitura
Compartilhar experiências e impressões pessoais nunca esteve tão em alta. O áudio abriu um leque de possibilidades para o gênero confessional, até agora restrito a autobiografias, diários e crônicas. O podcast vem nadando de braçada na empatia do século 21. A narrativa em primeira pessoa atrai e envolve. Com os fones de ouvido, então, a experiência é ainda mais íntima. Não se trata do voyerismo em voga, como alguns poderiam imaginar, mas do desejo de entender a vida como ela é na pele do outro. A turma da objetividade, formada no paradigma cientificista, torce o nariz para a exposição pessoal. Jamais. Nunca. Aos puristas (ou tímidos), lembro que o “eu” da narrativa confessional não é o “eu” narcísico, banal, das selfies. É um sujeito que olha para si com sinceridade e evoca, com suas revelações, o que há de mais humano em nós. Memórias pessoais estão vinculadas a memórias coletivas; carregam lembranças históricas e socioculturais, geram conexão, tocam e transformam.

Entre os podcasts que têm como centro a expressão da intimidade ou a utiliza na estratégia narrativa, sugiro três que muito me agradam:
“Meu Inconsciente Coletivo”, de Tati Bernardi, é quase uma sessão de análise. Tati deita e rola no divã. Na segunda temporada, conversa com grandes psicanalistas sobre a deliciosa e arriscada aventura do amor. Dá para se divertir e aprender muito com as neuroses de Tati, que mergulhou fundo na crônica e na ficção antes de se esbaldar no áudio nesta produção para a Folha de S.Paulo.
“Vozes: Histórias e Reflexões”, da CBN, bebe nas águas do Jornalismo Literário e não hesita em usar a intimidade quando a história pede ou permite. Gabriela Viana, que lançou o podcast em 2018, inaugurou o estilo. No episódio “Adolescência, credo que delícia”, a jornalista fala de si e entrevista os próprios pais. Em “Amor na pandemia”, a equipe compartilha alguns de seus momentos tensos, em casa, com os parceiros e parceiras.
Vidas Negras, do jornalista Tiago Rogero, é mais uma produção refinada da Rádio Novelo. O primeiro episódio, “De onde sua família veio?”, abre com uma bela narrativa confessional. Rogero fala de sua ancestralidade negra e da dificuldade em conhecer a própria história. Voz macia. Texto que sensibiliza.
コメント