Monark não é o único; Nazismo cresce no podcast
- Márcia Detoni
- 9 de fev. de 2022
- 3 min de leitura
Já era previsto que, em algum momento, a extrema direita brasileira emularia a americana na defesa de ideias mais radicais, como a supremacia branca e o nazismo. E faria isso no ar, com naturalidade, nos inúmeros podcast políticos que já comanda na internet. Era só uma questão de quando. E isso ocorreu na segunda-feira, com o influencer Monark, do Flow Podcast, defendendo a legalização do Partido Nazista e o direito a ser antijudeu. Trata-se, segundo ele, de um direito à livre expressão, “uma ideia que acontece em outros lados do mundo, nos EUA por exemplo”. O argumento é simplista. Como importante pilar do Estado Democrático de Direito, a liberdade de expressão garante a circulação de ideias, o debate e a necessária crítica. Mas grupos supremacistas que recorrem à violência contra judeus, negros, homossexuais, estrangeiros e outras minorias são maças podres no cesto social.
Muitos viram na fala de Monark apenas um triste deslize, ou um despreparo na condução da conversa, algo menor. Outros preferem ignorar os influencers. Falta de visão histórica e de compreensão do novo poder das mídias digitais. Não podemos ser ingênuos. O Flow é um dos podcasts mais ouvidos do país, com 3,6 milhões de seguidores. O nazismo cresce sub-repticiamente, com uma pequena fala aqui, outra ali, um ouvinte entusiasmado aqui, outro ali, aplausos mais acolá. Nos EUA, supremacistas brancos, neonazistas e extremistas de direta começaram discretos e hoje já dão cartas no jogo político. Nos dois últimos anos, montaram uma rede de podcasts crucial para espalhar propaganda e desinformação, ganhar adeptos e organizar eventos e manifestações.

Não por acaso, o Flow tem por inspiração um dos shows mais populares dos EUA, o “Joe Rogan Experience”, apresentado por um comediante constantemente envolvido em declarações racistas. O Spotify pagou US$ 100 milhões de dólares pela exclusividade do podcast, que tem 11 milhões de dowloads por episódio. A entrevista com Elon Musk rendeu 40 milhões de visualizações. O Spotify resistiu, mas acabou retirando mais de 100 episódios do ar depois da pressão realizada pelo cantor Neil Young.
Quem abriu a tampa da garrafa para os extremistas foi o conselheiro eleitoral de Trump, Steve Bannon, com o site Breitbart News, focado na direita alternativa (alt-rigth). Estimulou o discurso do ódio, o nós contra eles, a ideia de uma América branca ameaçada por negros, estrangeiros, muçulmanos e latinos. Bannon nunca foi tolo a ponto de defender o partido nazista, nem de gravar vídeos com símbolos do Reich, mas foi enfático nos elogios a Leni Riefenstahl, famosa cineasta da propaganda hitlerista. Encontrou nela farta inspiração para a campanha de Trump.
Recente pesquisa realizada pelo Brookings Institute mostrou que os podcast políticos nos EUA tiveram forte papel na construção da teoria da fraude eleitoral, espalhado mentiras e desinformação sobre as eleições de 2020. O podcast de Bannon foi marcado 115 vezes por desinformação no período avaliado. Em breve veremos algo assim aqui também. Se não formos firmes e vigilantes na proteção dos direitos humanos e das instituições democráticas, novos demônios surgirão.
Para os que ficaram curiosos em relação ao sucesso do Flow, a fórmula é simples: conversa de mesa de bar, papo leve e descontraído. Nada de entrevista estruturada. Isso deixa os convidados à vontade e livres para respostas engraçadas e surpreendentes. Eu sugiro que deixemos o Flow na geladeira. Que tal ouvir, na mesma linha, o Podpah? Com quatro milhões de inscritos, Igor Cavalari e Thiago Marques (o Mítico) obtiveram quase 292 mil visualizações simultâneas na entrevista com Lula em 2/12/21. Dá para entender por que políticos de todos os partidos têm procurado os podcasters. Vale conferir o formato.
Comments